Como um desdobramento da perda de credibilidade dos atores políticos, o
Judiciário passa a ser visto como a instituição apta a funcionar como
fiscalizadora dos demais poderes estatais. Tal constatação redundou em um
crescimento acentuado no número de ações judiciais, ensejando a chamada
“explosão da litigiosidade”, conforme expressão cunhada por Boaventura de Sousa
Santos (SANTOS, 1989, p. 39).
Com uma previsão maior de garantias nas Constituições, associada à adoção
de medidas tendentes à ampliação do acesso à justiça, ocorreu um despertar de
consciência da sociedade em geral para a possibilidade de efetivação dos
direitos com o ingresso de demandas no Judiciário.
Além disso, no que tange ao ordenamento jurídico brasileiro, algumas
reformas procedimentais e a criação dos Juizados Especiais, no âmbito estadual
e federal, ensejaram a “descoberta” do Judiciário por uma camada da população
que, até então, dificilmente o visualizavam como meio viável à efetivação dos
direitos, tanto pela onerosidade excessiva (caracterizada pelo pagamento de
custas e honorários advocatícios, ou mesmo pelo deslocamento até os foros,
muitas vezes situados apenas nas capitais dos Estados) quanto pelos aspectos
relacionados à efetividade do serviço prestado (incalculável demora no
processamento dos feitos, ausência de racionalidade na tramitação dos
processos, bem como a dificuldade no cumprimento das sentenças, entre outros).
Contudo, Andrei Koerner adverte que o tema dos juizados especiais pode
apresentar um resultado paradoxal, pois a mediação judicial dos conflitos é
ampliada e, ao mesmo tempo, é limitada a efetividade das garantias constitucionais
e o respeito às formas processuais, pois um conjunto maior de conflitos é
solucionado por mecanismos informais (KOERNER, 2004, p. 79).
Houve, de todo modo, um crescimento não apenas numérico dos processos
judiciais, mas também qualitativo, deparando-se os juízes e tribunais com
pretensões cuja concretização submetia-se, até então, à estrita
discricionariedade do Legislativo ou do Executivo.
Conforme observa Antoine Garapon (GARAPON, 2001, p. 24), o controle
crescente da justiça sobre a vida coletiva é “um dos maiores fatos políticos”
do final do século XX, nada mais podendo escapar ao controle do juiz. Segundo o
autor, as demandas políticas, desiludidas com um Estado inativo (Legislativo e
Executivo), se voltam maciçamente para a justiça.
Assiste-se, exemplificativamente, à propositura de ações tendentes a: assegurar
o recebimento de medicamentos ou o atendimento hospitalar; compelir escolas ou
universidades à efetivação de matrícula; determinar a entidades públicas a
realização de concurso tendente à contratação de servidores; entre outras. De
igual modo, vê-se o aumento no número de demandas visando à proteção de
interesses difusos e coletivos, bem como o incremento na efetivação do controle
da constitucionalidade das leis pelo Judiciário, através do modelo difuso ou
concentrado. Não se olvide, ainda, da interposição de ações por partidos
políticos, com o escopo exclusivo de inserir o Judiciário em meio às disputas
políticas subjacentes.
Se a democracia pressupõe, para que sua prática se efetive, um jogo
dialético e infindável de tensões, é evidente que, em cenários como o
brasileiro, o Judiciário receberá – como tem recebido – uma diversificada gama
de conflitos que, expressando situações e valores de presença relativamente
recente, correspondente à pressão do sistema sobre o aparelho judicial (CARVALHO,
1998, p. 163).
Segundo relata Zaffaroni, a incorporação dos direitos chamados “sociais”
e suas contradições regionais, com a sequela de marginalização e exclusão, isto
é, de disparidade gravíssima entre o discurso jurídico e a planificação
econômica provoca também o aumento de demandas judiciais, com características
próprias: o aumento da burocracia estatal (e sua pretendida redução por força
de cortes orçamentários) e a produção legislativa impulsionada unicamente pelo
clientelismo político provocam um maior protagonismo político dos juízes
(ZAFFARONI, 1995, p. 23-24).
Exige-se, nesse passo, um Judiciário mais participativo, capaz de decidir
conflitos de diversos matizes que surgem na sociedade (VERBICARO, 2008), com
destaque para as questões de índole estritamente política, acima referenciadas.
A despeito do inevitável reconhecimento dos poderes do juiz, chegando-se
a falar de um “Estado de Justiça”, de uma “ditadura dos juízes” ou de um
“governo dos juízes”, a irrupção do ativismo judicial não deve ser entendida
como uma transferência de soberania para os magistrados, mas, sobretudo, como
uma transformação da própria democracia.
Zaffaroni apresenta-nos uma síntese das reações provocadas em face do
protagonismo judiciário: “o austríaco René Marcic o saúda como um logro das
democracias de pós-guerra, o alemão Forshoff o vislumbra apoliticamente, como
um “Estado de justiça”, no qual o juiz decidirá livremente em que momento deva
deixar de submeter-se à lei. Neste confuso argumento é também enquadrada a
“ditadura dos juízes”, que é o estribilho mais ridículo e aberrante, porque é
“a única ditadura que jamais existiu na história”. Efetivamente, o “gouvernment
des juges” foi um argumento sempre usado por todos os políticos franceses para
rechaçar o controle de constitucionalidade das leis, com o resultado de que a
França possui hoje o sistema judiciário mais atrasado da Europa” (ZAFFARONI, 1995,
p. 44).
Antoine Garapon (GARAPON, 2001, p. 39) realça que a grande popularidade
dos juízes está diretamente relacionada ao fato de que foram confrontados com
uma nova expectativa política, da qual se sagraram como heróis, e que
encarnaram uma nova maneira de conceber a democracia. Para o autor, só podemos
sair de uma “oposição dramatúrgica” entre a soberania popular e os juízes se
concluirmos que a transformação do papel do juiz corresponde à transformação da
própria democracia e as transformações da democracia contemporânea devem-se
menos ao crescimento do desempenho efetivo do juiz do que à importância do
lugar simbólico que ele vem conquistando, quer dizer, à própria possibilidade
de sua intervenção.
A conclusão apresentada pelo autor ganha especial relevo se reconhecermos
que, de fato, combate-se mais a “possibilidade” de intervenção judicial do que
eventual controle efetivamente exercido. Muito se fala sobre a impossibilidade
de o Judiciário interferir nas políticas públicas, sob pena de ensejar um grave
dano às previsões orçamentárias e, paralelamente, à administração das finanças
públicas; contudo, não podemos mencionar qualquer estudo que tenha analisado,
de forma científica e estatística, o suposto impacto ou efeito nocivo
concretamente gerado pelas decisões judiciais.
No próximo item será analisado o tema da judicialização da política, em
que nos ocuparemos de conceituar a expressão, de realçar a admissão do ativismo
judicial pelo ordenamento e de fazer especial referência às opiniões existentes
quanto aos limites da intervenção pelo Judiciário.
3.1. Conceito
A judicialização da política caracteriza-se, especificamente, pela
extensão da competência da justiça sobre as atribuições do Executivo, por sua
atuação no controle da constitucionalidade das leis ou no reconhecimento da
inconstitucionalidade por omissão e mesmo por sua convocação para mediar
disputas políticas. Ocorre sempre que os juízes ou os tribunais, no desempenho
regular de suas funções, afetam de modo significativo as condições da ação
política.
Com efeito, a
judicialização da política como fenômeno social nas sociedades contemporâneas
passa a introduzir uma nova caracterização para os conflitos sociais, na medida
em que transfere para o Judiciário a incumbência de resolver conflitos antes adstritos
aos poderes institucional e democraticamente constituídos para tanto
(VERBICARO, 2008).
Os magistrados, na concepção de João Paulo Dias, convertem-se em
“árbitros das lutas políticas” (DIAS, 2004, p. 17). Estabelece-se, de fato, uma
situação de indagação quanto ao papel institucional
da justiça, a partir de um conflito entre uma política democrática calcada numa
cidadania ativa e um Judiciário mais participativo nas questões políticas do
Estado.
Este fenômeno implica um questionamento da justiça que põe em causa não
só a sua funcionalidade, como também a sua credibilidade, ao atribuir-lhe
desígnios que supostamente violam as regras da separação dos poderes dos órgãos
de soberania.
Deve-se notar, porém, que a discussão sobre a judicialização da política
não é recente. De acordo com José Alcebíades de Oliveira Júnior, a política e o
direito são, desde sempre, duas faces de uma mesma moeda, que é o poder, sendo
imprescindível que andem juntos, sob pena de imposição do absolutismo (OLIVEIRA
JÚNIOR, 2008).
De certo modo, o trato político da questão é inerente à própria produção
da norma jurídica. Por tal motivo, desde que se passou a admitir certo grau de
subjetividade na atividade interpretativa, com o advento do fenômeno
antipositivista, que trouxe meios legais de relativizar o comando contido na
norma, reconhece-se – como função reservada ao juiz – um passo político,
enquanto atividade de exercício de poder estatal (FRANCO, 1997, p. 245).
Trata-se de uma tendência das democracias contemporâneas, tendo como
consectário a politização da justiça. Impõe-se, assim, a análise de sua
admissão pelo ordenamento jurídico, bem como o exame acerca dos questionamentos
quanto aos limites da intervenção.
3.2. A Admissão da Intervenção Judicial
pelo Sistema Democrático
Entendemos que a atuação do Judiciário na entrega de bens e direitos
constitucionalmente assegurados, sempre que convocado para tanto através de
demandas tendentes à proteção de direitos individuais ou coletivos, é não
apenas admitida pelo sistema democrático, como é a ele inerente. Com efeito,
quando falamos em
Estado Democrático de Direito, há uma imediata associação com
a ideia de controle recíproco entre os poderes, afastando-se a possibilidade de
autoritarismo ou qualquer forma de violação manifesta às garantias asseguradas.
Tais aspectos, associados à possibilidade de interpretação, pelo
Judiciário, e à previsão expressa dos meios de controle da constitucionalidade
das leis, denotam a plena conformidade entre a intervenção jurisdicional e o
sistema jurídico incumbido de assegurá-la. Casos há, inclusive, em que a busca
pelo Judiciário constitui o único meio de concretização de determinada
garantia, de modo que, não sendo admitida a intervenção, o Texto Constitucional
não sairia do plano das intenções, despido de qualquer efetividade prática.
Trata-se, em suma, do poder naturalmente encarregado de cumprir essa
missão de concretizar, densificar e realizar praticamente as mensagens
normativas da Constituição (GOMES, 1997, p. 467). O Judiciário, ao lado dos
demais poderes do Estado, é tão responsável quanto os demais pela consecução
dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (NALINI, 2008, p.
306).
Assim, inerente ao sistema democrático, existe uma complementaridade
entre os poderes. Segundo o filósofo François Rigaux, o juiz, quanto mais se eleva
na hierarquia judiciária, mais se aproxima do exercício de uma função quase
legislativa. Assim, quando o juiz constitucional ou o juiz internacional assume
a tarefa de deduzir das penumbras constitucionais um direito, uma liberdade que
não é mencionada ali em termos explícitos ou então quando deve dirimir um
conflito entre duas normas de igual categoria, ele supre o silêncio do
legislador (RIGAUX, 2000, p. 323).
Inclusive, a ratio do controle
exercido pelo Judiciário, longe de buscar a sedimentação de uma superioridade
hierárquica no plano institucional ou a ingerência em seara inerente ao
Executivo, é a de velar para que o exercício do poder mantenha uma relação de
adequação com a ordem jurídica, substrato legitimador de sua existência.
Emerson Garcia ressalta não merecer acolhida a tese de uma possível
supremacia do Judiciário em relação aos demais poderes. As suas vocações de
mantenedor da paz institucional e de garantidor da preeminência do sistema
jurídico assumem especial importância no Estado social moderno, no qual aumenta
a importância do Estado em relação ao indivíduo, com a correlata dependência
deste para com aquele, exigindo do Judiciário o controle dessa relação (GARCIA,
2005, p. 129).
A experiência jurídica revela-se, dessa maneira, como sendo
concomitantemente uma forma de resolver conflitos entre indivíduos e um modo de
se promover a sociabilidade no seio da comunidade (ARRUDA JR., 2002, p. 228).
Conforme advertência de Robert Alexy, é necessário compreender não só o Parlamento
mas também o Tribunal Constitucional como representação do povo. Enquanto o Parlamento
representa o cidadão politicamente, o Tribunal Constitucional o faz
argumentativamente. Por outro lado, diante do risco de ocorrência de faltas
graves no Parlamento, com a excessiva imposição das maiorias, um Tribunal Constitucional
que se dirige contra tal não se dirige contra o povo, senão, em nome do povo,
contra seus representantes políticos (ALEXY, 1999, p. 60).
É preciso, assim, reconhecer a dimensão política da função jurisdicional
como algo que serve à própria democracia, sendo um dos seus atributos
essenciais.
Observa Dallari que os juízes exercem atividade política em dois
sentidos: por serem integrantes do aparato de poder do Estado, que é uma
sociedade política, e por aplicarem normas de direito, que não necessariamente
políticas (DALLARI, 2007, p. 89).
É justamente dentro desse contexto que se discute a possibilidade de os
magistrados legitimarem-se socialmente pelo exercício de uma nova função ativa
dentro da ordem instituída, enquanto autorizada e, de certa forma, exigida
pelos legítimos interesses sociais postos em permanente conflito na era
pós-moderna (MOREIRA, 2004, p. 91).
3.3. O Grau de Intervenção Judicial
Convém apresentar, neste ponto, dois eixos analíticos que enfrentam o
tema da intervenção judicial, examinando a fronteira que se deve traçar entre o
ativismo judicial e um exercício mais comedido do controle, e procuram
estabelecer, em maior ou menor grau, limites à atuação do Judiciário, no que
toca às atribuições normativamente reservadas aos demais poderes.
3.3.1.
Eixo Procedimentalista
Tal vertente
caracteriza-se pela ênfase nos processos democráticos de formação da vontade
política. Em defesa de um Judiciário com poderes mais limitados em respeito aos
processos democráticos, sustenta-se que os tribunais apresentam sérias
dificuldades para atuar de forma a reconhecer e decidir acerca dos conflitos
sociais, de forma que os canais políticos apresentam-se mais efetivos à
necessidade de reformas sociais do que o Judiciário.
Partidário
desta tese, o autor Cass R. Sunstein propõe um minimalismo judicial,
apresentando três problemas de especial relevância: 1) no que pertine à
democracia e à cidadania, entende que a dependência em relação às cortes reduz
os canais democráticos de procura por mudanças, desviando energia e recursos da
política e excluindo as conquistas alcançadas por parte dos próprios cidadãos,
o que pode gerar prejuízos consideráveis à democracia; 2) quanto à eficácia,
entende que as decisões judiciais são geralmente ineficazes em promover
mudanças sociais, uma vez que, ainda quando exista a intervenção, não é
possível associar qualquer alteração da sociedade ao provimento jurisdicional;
e 3) haveria um foco limitado da adjudicação, uma vez que a proteção de
determinados interesses poderia ser realizada em detrimento de outros, sendo
apta a gerar desequilíbrio com os recursos destinados aos gastos sociais
(SUNSTEIN, 1994, p. 142-145).
Assim, o
autor defende que somente em raros casos as cortes deveriam interferir em
políticas aprovadas por processos democráticos: 1) quando envolvidos direitos
centrais para o processo democrático e cuja solução deva ser estranha à
política (direito de voto e de expressão); 2) quando envolvidos grupos ou
interesses que, pela natureza, são incompatíveis a uma justa deliberação em
processos democráticos (proteção das minorias).
3.3.2. Eixo Substancialista
O enfoque do eixo substancialista consiste na defesa de um Judiciário
mais participativo nas questões políticas do Estado. Parte-se da defesa de um
Judiciário que atue ativamente em nome do respeito aos direitos dos cidadãos e
da solidez dos princípios democráticos, figurando-se como guardião dos
princípios e valores fundamentais da democracia e como importante instrumento
de transformação social.
O Judiciário, sob tal aspecto, constitui um importante instrumento de
participação das minorias no processo democrático, fornecendo-lhes
representatividade. Assim, este contributo do Judiciário à democracia
representativa denotaria o seu pleno enquadramento também como canal
democrático, sem qualquer oposição aos demais poderes.
Como ressaltado por Andreas J. Krell (KRELL, 2002, p. 74), para os
defensores do judicial ativism, o
juiz deve assumir a nova missão de ser interventor e criador autônomo das
soluções exigidas pelos fins e interesses sociais, tornando-se responsável pela
conservação e promoção de interesses finalizados por objetivos
sócio-econômicos, o que implicaria uma mutação fundamental que transforma o
juiz em administrador e o convoca a operar como agente de mudança social.
3.4. A Opinião de Ronald Dworkin
O entendimento de Ronald Dworkin assemelha-se à posição do eixo
substancialista. O autor vislumbra no Judiciário um importante veículo de
participação das minorias na democracia, defendendo o ativismo judicial como
algo necessário e imprescindível para a proteção dos direitos fundamentais. A
legitimidade dos magistrados para tanto decorre, em sua concepção, da
utilização dos argumentos de princípios, e não argumentos de política.
Em seu livro Uma Questão de
Princípio, Dworkin questiona se é ofensivo para a democracia que questões
políticas de princípio sejam decididas por tribunais e não por funcionários
eleitos (DWORKIN (2), 2005, p. 25-26). Para o autor, o esclarecimento da
questão depende do exame da suposta perda de poder político pelos cidadãos
individuais, uma vez que – seja como for que se meçam perdas de poder político
– alguns cidadãos ganham mais do que perdem.
Na medida em que os cidadãos passam a dispor da possibilidade de
exigirem, como indivíduos, um julgamento específico acerca dos seus direitos,
as minorias ganharão em poder político, sobretudo porque o acesso aos tribunais
é efetivamente possível e porque as decisões dos tribunais sobre seus direitos são
efetivamente fundamentadas.
Em idêntico sentido, Antoine Garapon aduz que é sob a forma do direito e
do processo que o cidadão das democracias realiza sua ação política. A justiça
torna-se um espaço de exigibilidade da democracia e oferece potencialmente a
todos os cidadãos a capacidade de interpelar seus governantes, de tomá-los ao
pé da letra e de intimá-los a respeitarem as promessas contidas na lei. Com
essa forma mais direta de democracia, o cidadão-suplicante tem a impressão de
melhor controlar sua representação (GARAPON, 2001, p. 49).
Para Dworkin
nenhuma diretriz política nem objetivo social coletivo podem sobrepor-se a um
autêntico direito individual – direito esse não apenas jurídico, mas também
moral. Os direitos individuais adquirem, pois, relevância frente aos direitos
coletivos. A justiça, nesse passo, é uma questão de direito individual, não,
isoladamente, uma questão de bem público (DWORKIN (1), 2007. p. 39).
Visando à
proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos, de acordo com a perspectiva
ora traçada, o papel ativo do Judiciário não é apenas admissível, como desejável,
constituindo um veículo de “recuperação dos espaços de participação da
comunidade” (APPIO, 2004, p. 139).
4. CONCLUSÃO
Procuramos, através do presente ensaio, traçar um panorama acerca dos
fundamentos e das conseqüências do ativismo judicial. A intervenção judicial
nos atos dos demais poderes constitui uma realidade do Estado Democrático,
sendo inclusive necessária à sua manutenção. Impõe-se, de tal forma, centrar as
atenções nos limites aos quais deve estar jungido o controle jurisdicional, a
fim de que seja exercido com respeito ao Texto Constitucional e de forma
consentânea com o ideal de preservação dos direitos fundamentais.
O Judiciário, por certo, deve estar adaptado às novas exigências sociais,
o que confere especial relevância à difusão das reformas judiciais ao redor do
mundo, com a preocupação efetiva com a renovação de sua estrutura e com a
previsão de mecanismos de controle de sua atuação, no escopo de resguardar a
sua credibilidade.
Exige-se do Judiciário a sua imposição como um verdadeiro poder, a partir
de uma profunda alteração em sua estrutura e em sua dinâmica, para que tenha
condições de fornecer à sociedade as respostas às suas pretensões.
Deve-se, assim, partir do abandono da oposição da justiça à democracia,
compreendendo o exercício da intervenção judicial como um instrumento eficaz contra
o autoritarismo, voltado, especificamente, à preservação das instituições
democráticas e a assegurar o cumprimento dos valores encartados na
Constituição, os quais, se despidos de mecanismos de efetivação, não passariam
de abstrações intangíveis.
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Texto muito bom sobre a judicialização da política, está de parabéns. Gostaria de trocar algumas ideias com você. Inclusive, fiquei com algumas dúvidas...
ResponderExcluirComo por exemplo a intervenção judicial na Política configura uma forma de ativismo ?
Dada a nossa Constituição ser analítica, os problemas políticos entram na seara do judiciário, o que faz ocorrer a judicialização da política. Necessariamente, neste estágio há o problema da interpretação, pois se há um redimensionamento do papel do Judiciário na democracia, como não se preocupar com afirmações como estas: "o alemão Forshoff o vislumbra apoliticamente, como um “Estado de justiça”, no qual o juiz decidirá livremente em que momento deva deixar de submeter-se à lei".
Que a ditadura do Judiciário é uma falácia não resta dúvida, todavia o nível de discricionariedade sem limites na interpretação que se realiza para decidir um caso perpassa qualquer critério de decidibilidade comum. Para Kelsen, em sua teoria pura, a interpretação autêntica, era um ato de vontade, político em seu dizer. Mas se a interpretação for o que o intérprete abalizado e dotado de poder diz que é, como no Judiciário. Estamos entrando em uma pergunta incômoda: Direito é o que os Tribunais dizem que é?
Se a pergunta for sim, estamos diante do Realismo Jurídico, se a resposta for não precisamos saber em que estágio estamos encarando a intepretação antes ou depois da virada heideggeriana e de Wittgenstein.
E, talvez, essa seja a grande questão de Dworkin, como evitar dois pesos e duas medidas diante de casos concretos semelhantes e evitar o realismo jurídico. Que os juízes interpretam a lei, a Constituição e etc não há problema algum, o problema está "como eles interpretam"? O que lembra muito a hipótese estética de Dworkin.
E aí eu fico com a seguinte pergunta?
“É a interpretação um ato de vontade do intérprete ou o resultado de um projeto compreensivo no interior do qual se opera constantes suspensões de pré-juízos que constitui a perseguição do melhor sentido para a interpretação?” Clarissa Tassinari, 2013 (Jurisdição e Ativismo Judicial -livraria do advogado).
Se a resposta for um ato de vontade estaremos falhando com o Direito, pois:
Se o Direito, enquanto estrutura discursiva, não forjou uma tradição para dizer o que cada um desses institutos significa, então fracassamos. Sim, fracassamos pela simples razão de que o direito e seus institutos são, melancolicamente, aquilo que cada julgador diz (e sente) que é.
http://www.conjur.com.br/2014-mar-06/senso-incomum-sempre-ainda-dura-face-ativismo-terrae-brasilis